Flávia Maia
Caso apareça em sua casa uma cobra, uma coruja ou variadas borboletas, não se espante! Esses animais estão deixando a região do Setor Noroeste e procurando uma nova moradia. Para abrigar 40 mil pessoas divididas em 20 superquadras e 220 blocos de apartamentos, as primeiras derrubadas de árvores começaram a ser feitas e vários animais estão desabrigados. Dos 300 hectares que compõem o setor, apenas 58 ficarão preservados.
Moradores de regiões como Asa Norte, Setor Militar Urbano e Setor de Oficinas Norte já estão sentindo a presença dos novos companheiros de endereço. Em novembro do ano passado, por exemplo, uma capivara foi vista na 108 Norte, lembra a economista Patrícia Almeida. “Os animais que ficam à mercê dessa questão toda”, critica.
A aposentada Sandra Fayad, 61 anos, percebeu o aumento de animais que tem visitado sua residência, localizada na 713 Norte. Por ter na frente de casa uma horta e também o cultivo de plantas ornamentais, o seu quintal tornou-se um atrativo especial. Segundo ela, desde outubro, quando começaram as primeiras derrubadas de árvores no Noroeste, o jardim está movimentado de pássaros e borboletas e ela perdeu as contas da quantidade de diferentes espécies que têm aparecido. “Aqui só vinha borboleta branca, agora apareceu uma escura avermelhada muito bonita.” A goiana conta que vários pássaros têm tentado competir com o beija-flor que sempre foi assíduo frequentador da casa. “Mas o beija-flor é bravo e não deixa os outros beberem sua água, por isso, coloquei uma vasilha no chão para as outras espécies utilizarem”, diz.
Pouca proteção
O motivo das “invasões” se deve a várias questões que vão além da diminuição brusca de área verde. O relatório de impacto ambiental feito em 2003, com modificações em 2008, prevê poucas medidas de proteção para os animais que viviam no local, tanto que o próprio texto admite que “a perda da área pode excluir imediatamente algumas espécies, se as mesmas forem raras”. Para protegê-las, o documento fala em murar o futuro Parque Burle Marx e isolar o fluxo de animais para as quadras do Noroeste. O relatório também sugere um monitoramento da fauna, e investimento em programas de manejo e manutenção. Porém, o texto é vago e não diz quando essas ações devem ser realizadas e se acontecerão. Por isso, até hoje nada do sugerido foi executado, mesmo com as obras já em andamento.
A bióloga Ana Paula Inglez, analista do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis no Distrito Fedederal (Ibama-DF), explica que, apesar de sugerido, o resgate de fauna em uma área como a do Noroeste não é necessário, uma vez que é pequena, dentro da cidade e a ocupação do terreno está ocorrendo de forma gradual, isto é, por etapas. “Estão usando trator, se fosse fogo, que destrói a vegetação em uma semana, aí sim, morreriam mais animais.” Para ela, toda construção tem impactos e a do Noroeste está dentro da normalidade, por isso, em um primeiro momento, os animais que ali viviam vão procurar outros abrigos, que podem ser ou não, um imóvel no Plano Piloto. “Muita gente critica o Noroeste e mora em condomínio irregular, que tem muito mais impacto ambiental”, afirma Ana Paula.
Já o professor de geografia Valdir Steinke, da Universidade de Brasília, adota uma postura crítica em relação ao licenciamento ambiental conferido ao Noroeste. Segundo ele, justamente por estar dentro de um perímetro urbano, o cuidado com a área deveria ser maior. “Quando esses animais forem procurar refúgio o que eles vão encontrar? Construção. E as pessoas vão matar esses animais se eles chegarem à casa delas, é o nosso instinto de defesa. Vão sobreviver aqueles que conseguirem chegar ao Parque Nacional”, alerta.
Fonte: Correio Braziliense
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