sexta-feira, 21 de maio de 2010

Pernambucana de 74 anos vive com 75 animais de estimação no Recife

Do JC Online
Dona Tarcísia Maria tem em sua casa 60 gatos, 14 cahorros e uma pomba de asa quebrada
Dona Tarcísia Maria tem em sua casa 60 gatos, 14 cahorros e uma pomba de asa quebrada
Foto: Davi Lira JC/Online

Antes de morrer, exatamente na manhã do dia 3 de janeiro de 1889, o influente filósofo alemão Friedrich Nietzsche foi decretado louco. O atestado de insanidade teve como gota d’água um abraço. Quem testemunhou a estranha conduta de Nietzsche disse que ele caminhava pela Praça Carlo Alberto, em Turim, na Itália, quando viu um cavalo sendo brutalmente espancado pelo dono. Como se sentindo a dor do animal, o abraçou e chorou aos soluços. Os médicos encontraram uma justificativa para o gesto: Nietzsche tinha a constituição nervosa extremamente sensível e deveria ser internado com urgência.

A loucura não passa de uma máscara que esconde alguma coisa, esconde um saber fatal e demasiado certo. Nietzsche (1844-1900)

Se os médicos do filósofo alemão conhecessem a pernambucana de Surubim (a 124 km da capital) Tarcísia Maria da Conceição, 74 anos, moradora do bairro do Cordeiro, Zona Oeste do Recife, provavelmente passariam o mesmo diagnóstico. É que ela também chora quando imagina o sofrimento de um dos seus 75 animais de estimação acolhidos na imensa casa dela, desde 1991. São 60 gatos, contando com o “príncipe Benjamin”; 14 cães, contabilizando, é claro, o adorado “Bidú” e a combalida “princesa-cega”; e uma pomba de asa quebrada e pelugem colorida, batizada nessa quarta (19) pelo nome de “Natally”.

» VEJA NO VÍDEO A CASA, OS ANIMAIS E UMA MENSAGEM DE DONA TARCÍSIA:

A professora estadual aposentada formada em letras latinas na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e licenciada e com formação em Direito pela Universidade Católica conta que “o motivo maior de meu medo é a insensibilidade e a comodidade humana diante do sofrimento dos animais, que são tratados como propriedade do homem. Em um mundo com tão poucos que se preocupam verdadeiramente com o bem estar animal, eu prefiro desviar minha atenção àqueles que possuem a dor nos olhos”. É por isso que ela recebe tantos bichos e os coloca em todas as partes da casa.

Aliás, não se entra mais na casa amarela de dona Tarcísia, como é conhecida nas redondezas e na vizinhança, que não gosta muito de tamanho afeto pela vida animal, do barulho e da sujeira. É fato que o conforto do imóvel já se perdeu. Até a varanda foi dominada por mamíferos, aves, insetos (e aracnídeos). Desejáveis ou não, é com eles que ela divide o espaço apertado. Afora a companhia dos bichos, ela vive sozinha - é solteira e tem apenas um irmão idoso, com duas filhas, que não aprova o acolhimento dos animais.

Mas não é só por isso que a luta travada por ela pela proteção e recebimento dos pets seja tarefa árdua. Cansada, com uma aposentadoria que “há mais de 20 anos continua sendo nada e mal dá para comprar rações e reformar a casa”, quase não arruma tempo para cozinhar. A sua dedicação é plena e exclusiva a seus protegidos de bico e focinho. O gasto médio da comida de um gato, por exemplo, é de aproximadamente R$ 1,30 por dia, assim, considerando os 60, a soma chega a casa dos R$ 2 mil.

E foi há dois anos que o projeto criado por um grupo de universitários, veterinários e professores da UFPE, o “Adote um vira-lata”, descobriu uma dona Tarcísia atrapalhada com a quantidade crescente de companheiros em seu quintal. Desde então, a ajuda é constante. O objetivo desses defensores dos animais é “arranjar outros tutores para os cães e gatos abrigados no lar de dona Tarcísia e em outras situações de abandono” afirma a coordenadora do projeto, a veterinária Ariene Guimarães Bassoli. Porém, enquanto os protegidos da aposentada não encontram outro lar, os membros do “Adote” ajudam com o banho dos animais, vermífugos, vacina e esterilização.

A ajuda, porém, não é diária. Para o dia a dia, o esforço é redobradamente cansativo, principalmente com a limpeza. No entanto as dores sentidas por dona Tarcísia não são apenas do cansaço ou da idade. Ela padece com uma colite há alguns anos e o tratamento foi, segundo ela, "entregue às mãos de Deus". Sem dinheiro para pagar um plano de saúde, ela se aflige com a possibilidade de não poder cuidar de seus animais. Ainda assim, ela nega qualquer arrependimento e conserva a esperança de que sua missão será compensada. “Quem sabe Deus não absorve meus pecados?”, fala sorrindo.

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